Friendzone - Capítulo 1



Melissa é uma garota inteligente, do tipo que se lembraria sem esforço o número atômico do carbono durante uma tentativa de encontrar mensagens ocultas na sequência numérica de Fibonacci. Sem contar que ela faz tudo isso enquanto assiste Fringe em seu laptop e tenta decifrar aqueles misteriosos glyph codes.


O trajeto de ônibus entre a escola e sua casa durava vinte minutos, o que era tempo suficiente para avançar pelo menos dois capítulos no Guia do Mochileiro das Galáxias enquanto ouvia Joan Jett em seu iPod. A chuva embaçava a janela do ônibus e gotas insistentes teimavam em atravessar a pequena abertura da janela, a mesma que minutos antes fora fechada abruptamente por um passageiro revoltado, como se as gotas de chuva fossem gotas ácidas. Não demorou para que a condensação transformasse o vidro da janela em uma tela de pintura a dedo, para artistas anônimos entediados.

Melissa rabiscou um triângulo, traçou um círculo dentro dele e dividiu-o ao meio com uma linha reta. Qualquer potterhead que se preze reconheceria as “Insígnias da Morte”, ela sorriu admirando a perfeição do seu desenho, que rapidamente esvanecia dando lugar a uma nova tela de vapor sobre vidro, limpa e pronta para um novo ilustrador ou uma nova ilustração. Observou uma fumaça preta saindo do escapamento do ônibus que ia à frente, ver essa cena tornou inevitável completar o espaço restante do vidro rabiscando os seguintes números: 4 e 8, 15 e 16, 23 e... um sorriso bobo acompanhou a escrita do número que encerrava a sequência: 42, o sentido da vida!

Quase perdeu o ponto, lembrando do Sawyer e percebendo como ele se parecia com o Ricardo, um jogador de futebol do time da escola. Ela odiava futebol, mas por causa dele começou a frequentar o treino do time.

O porteiro do seu prédio, reconhecendo a loirinha de mechas azuis, parada junto ao portão, apertou aquele botão como se fosse Homer Simpson e observou a porta automática fazendo seu trabalho. Melissa cumprimentou-o com os olhos. Um breve sorriso e um leve inclinar simultâneo de cabeças completaram os protocolos sociais, logo correu para apanhar o elevador que subia vazio. Sozinha, fitando o espelho, encarava a si mesma.

Observou os próprios lábios, movimentando-os e umedecendo-os, mexeu no cabelo, pensou em pintá-lo completamente de roxo ou rosa, imaginou-se como Sakura, como Erza, como Saori.

No terceiro andar, o elevador se abriu e Erick entrou, o mancebo em questão era o seu "melhor amigo homem", com quem partilhava seu vício por Skins. Um garotinho ruivo de dezesseis anos, com o rosto cheio de sardas e que morava dois andares acima do seu, se conheciam desde pequenos, jogavam Guitar Hero e assistiam The Big Bang Theory, ele era como um irmão pra ela, um grande amigo.

- Oi! – disse ele, entrando no elevador com um sorriso recém-nascido que formava covinhas nas extremidades do seu rosto. Melissa sorriu de volta e perguntou:

-Aqui... você vai lá em casa depois né?

-Vou sim, vou almoçar e depois eu desço. Baixei “The Walking Dead” vou levar pra gente assistir!


- Vem logo então, que eu vou sair depois, vou ver o treino do time hoje – ela disse.

Beleza então – ele respondeu, denunciando a morte prematura do seu sorriso recém-nascido, o elevador se abriu e Melissa saiu. De repente ela se virou e disse:

Anda logo hein!

A porta do elevador se fechou e mesmo que Erick tivesse respondido algo ela não poderia ouvi-lo. Deu um soco falso na parede do elevador e fingiu gritar sem emitir nenhum som:

-Eu te amooooo! Sua bobaaaaa! Como você não percebeeeee? 

Um longo e triste suspiro calou seu grito mudo, enquanto o elevador subia.

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